sexta-feira, 29 de agosto de 2008

O Santo Rosário

"O Rosário é a minha oração predilecta. Oração maravilhosa. Tão simples e tão rica! A todos exorto cordialmente: rezai-o" João Paulo II

Quais são as Bênçãos do Rosário?
1. Os pecadores obtêm o perdão.
2. As almas sedentas são saciadas.
3. Os que estão atados vêem seus nós desatados.
4. Os que choram encontram alegria.
5. Os que são tentados encontram tranqüilidade.
6. Os pobres são socorridos.
7. Os religiosos são reformados.
8. Os ignorantes são instruídos.
9. Os vivos triunfam sobre a vaidade.
10. Os mortos alcançam a misericórdia por via de sufrágios.



Quais os benefícios do Rosário?
1. Nos eleva gradualmente ao perfeito conhecimento de Jesus Cristo.
2. Purifica nossas almas do pecado.
3. Permite-nos vencer nossos inimigos.
4. Facilita-nos a prática das virtudes.
5. Inflama-nos do amor de Jesus Cristo.
6. Obtém-nos de Deus toda classe de graças.
7. Proporciona a nós com o que pagar todas as nossas dívidas com Deus e com os homens.



As Quinze Promessas da Virgem Maria aos que rezarem o Rosário:

1. Aqueles que rezarem com enorme fé o Rosário receberão graças especiais.
2. Prometo minha proteção e as maiores graças aos que rezarem o Rosário.
3. O Rosário é uma arma poderosa para não ir ao inferno: destrói os vícios, diminui os pecados e nos defende das heresias.
4. Receberá a virtude e as boas obras abundarão, receberá a piedade de Deus para as almas, resgatará os corações das pessoas de seu amor terreno e vaidades, e os elevará em seu desejo pelas coisas eternas. As almas se santificarão por meio do Rosário.
5. A alma que se encomendar a mim no Rosário não perecerá.
6. Quem rezar o Rosário devotamente, e tiver os mistérios como testemunho de vida, não conhecerá a desgraça. Deus não o castigará em sua justiça, não terá uma morte violenta, e se for justo, permanecerá na graça de Deus, e terá a recompensa da vida eterna.
7. Aquele que for verdadeiro devoto do Rosário não perecerá sem os Sagrados Sacramentos.
8. Aqueles que rezarem com muita fé o Santo Rosário em vida e na hora de sua morte encontrarão a luz de Deus e a plenitude de sua graça, na hora da morte participarão do paraíso pelos méritos dos Santos.
9. Livrarei do purgatório àqueles que rezarem o Rosário devotamente.
10. As crianças devotas ao Rosário merecerão um alto grau de Glória no céu.
11. Obterão tudo o que me pedirem mediante o Rosário.
12. Aqueles que propagarem meu Rosário serão assistidos por mim em suas necessidades.
13. Meu filho concedeu-me que todo aqueles que se encomendar a mim ao rezar o Rosário terá como intercessores toda a corte celestial em vida e na hora da morte.
14. São meus filhinhos aqueles que recitam o Rosário, e irmãos e irmãs de meu único filho, Jesus Cristo.
15. A devoção a meu Rosário é um grande sinal de profecia.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Capítulo 9 - No cadinho da purificação

1935-1936

Os últimos meses de 1935, passou-os a Alexandrina em exercício cada vez mais árduo e difícil das lições recebidas pelo Mestre Divino. Jesus não perde tempo; trabalha bem a sua vítima e desperta nela primeiramente uma grande pena de ver Deus ofendido.

Não me canso — lemos em carta de 19.9.35 — de oferecer (a Nosso Senhor) as minhas dores para O consolar e desagravar dos pecados do mundo. Eu não lhe posso explicar a pena que tenho de Nosso Senhor ser ofendido.

Lembro-me tanto das ofensas que Jesus recebe! Sinto tanto, tanto esses ultrajes! Quem me dera a mim poder impedir com as minhas dores, de se abeirar de Jesus essa imundície de pecados que a cada momento se comete!

Como se paga um tão grande amor, com uma tão grande ingratidão? Como pode haver coragem, depois de conhecer a Nosso Senhor, considerar o que Ele sofreu por nós e ver que é o nosso querido Paizinho do Céu tão amável e tão bom, o melhor de todos os pais, e voltar a ofendê-lo tão repetidas vezes e tão gravemente!

Nosso Senhor continua a ter-me no mesmo abandono e nas mesmas trevas ou maiores ainda. Parece-me que se escureceu o Sol e que se fez noite em minha pobre alma. Tudo se escondeu para mim. Que momentos tão tristes e tão aflitos eu passo e muitas vezes sem saber pelo quê. Em algumas ocasiões, figura-se-me que tenho sobre mim todos os crimes do mundo.

Este último sentimento frequente nas almas verdadeiramente vítimas de expiação, atingirá nela, como veremos mais tarde, extremos incomensuráveis. Entretanto, no meio de grande abandono espiritual, agravam-se-lhe os sofrimentos físicos a tal ponto, que chega a ser sacramentada.

Em carta de 26.9.35, lemos:

Cada vez me sinto pior. Sofro muito, tanto física com moralmente. Continuo no mesmo abandono; Nosso Senhor está bem escondidinho de mim.

Sábado à noite confessei-me; recebi a Nosso Senhor por Viático e também recebi a Extrema-Unção. Foi muito por minha vontade, porque temia morrer sem os Sacramentos.

Parecia-me não fazer nada bem; estava fria: não sabia agradecer a Nosso Senhor tantos benefícios. Enfim, parecia que era uma coisa deitada ao esquecimento.

No Domingo de manhã, o Sr. Abade, antes de partir para a Póvoa, voltou a trazer-me Nosso Senhor, mas eu fiquei como se não comungasse. Sabe o que me fez lembrar? Foi a cidade de Jerusalém, quando traziam Nosso Senhor em triunfo e ela se mantinha fria. Mas faça-se a vontade de Nosso Senhor. Penso bem que Ele, apesar da minha grande indignidade, tem atendido aos meus pedidos.

Eu costumo dizer-lhe assim: ó meu Jesus, crucificai-me convosco; santificai-me, meu bom Jesus, à vossa santíssima imagem de Cristo Crucificado.

Fazei-me participar de toda a vossa santíssima Paixão.

Não me engano: o meu Jesus ouviu-me. Na sua santíssima Paixão não foi Ele abandonado e não sentiu tristeza mortal? Mil vezes Ele seja bendito que tanto se abeirou e cobriu de benefícios esta grande pecadora que tão mal sabe corresponder a tanto amor e bondade.

No meio desse abandono, intensifica-se a conformidade com a vontade do Senhor. A 26.10.35:

Parece que Nosso Senhor me quer privar de tudo. Bendito Ele seja. O que eu quero é amá-lo e consolá-lo muito, sofra eu o que sofrer... Que me importam a mim as consolações, se Jesus está comigo e me dá forças para tudo sofrer e estou a fazer a sua santíssima vontade? É o que eu procuro e desejo sempre fazer. Eu queria desagravar muito a Nosso Senhor e desviar dele todos os crimes do mundo.

Que pena tão grande eu tenho de meu amado Jesus! Como Ele é ofendido nesta minha miserável freguesia! Pobre Jesus! E o que será por esse mundo fora! E Nosso Senhor é tão bom e sofreu tanto por nosso amor!

Eu também quero sofrer tudo, tudo quanto Nosso Senhor me enviar, por seu amor e para lhe salvar almas, muitas almas.

Toda esta biografia nos mostrará quanto Nosso Senhor vai aproveitar estas ofertas da sua vítima, na variadíssima maneira como a vai imolar.

Desde já lemos que a desolação prossegue cada vez mais temível:

O dia de Todos os Santos (carta de 4.11.35) foi muito atribulado para mim. Logo pela manhã sentia a impressão de aparecer diante de Nosso Senhor sem nada: de mãos vazias. Fazia-me lembrar um mendigo que não tem uns tristes andrajos para se cobrir: eu também não tinha nada para a minha pobre alma. Parecia-me que não tinha coração para amar a Nosso Senhor e sentia a impressão que mo separavam de mim, mas não sei como era.

Ontem voltei a sentir o que já há tempos tinha dito a V. Rev.cia: de repente me pareceu que estava carregada com todos os pecados do mundo: que todos os crimes eram meus. Mas eu não sei explicar como é que sinto isto.

E a 7.11.35:

Parece que cada dia me vai desaparecendo tudo cada vez mais. Parece que mais se escurece aquele Sol divino que tanto aquecia, iluminava e dava força à minha pobre alma...

Mas paciência! Quero sofrer tudo, por amor do meu amado Jesus e para lhe salvar muitas almas. Foi esta a missão que Nosso Senhor me confiou neste mundo, não é verdade? Como é bela e consoladora a oração do Padre-nosso! Faça-se a vossa vontade assim na terra como no Céu! Seja esta minha maior consolação, saber que estou a fazer a vontade do meu querido Jesus, que tanto tem amado esta pobre e miserável pecadora.

Como o meu querido Jesus se tem dignado ter-me num abandono tamanho! (lê-se 28.11.35) Eu não me sei explicar: não sinto consolação nenhuma em nada, nem mesmo quando comungo. Estou insatisfeita; apetece-me chorar, mas ainda não chorei. Vou falando eu para o meu Amado e tenho a certeza que Ele lá no íntimo da minha alma não deixará de ouvir os meus pedidos e aceitar as minhas ofertas. No meio de todo este abandono, muitas vezes me passa pela mente o faça-se a vossa santíssima vontade em tudo e sempre! O que eu quero é consolar muito o meu Esposo Sacramentado, ainda que para mim não haja nenhuma consolação; pois que assim levo a luz a muitas almas e eu queria salvá-las todas.

Pobres pecadores, tanto queria que não fosse mais nenhum para o inferno!

O Natal desse ano passou-o em grande aflição; revela-o a carta de 26.12:

... Outra coisa me preocupa muito: parece-me que sou daquelas criaturas que passam os dias e as noites sem se lembrarem de Nosso Senhor e sem nada sofrerem pelo seu divino amor; enfim que não tenho merecimento nenhum diante do meu querido Jesus. Não sei como possa ser isto, pois, desde que cheguei ao uso da razão, não me lembra de passar dia nenhum sem que me lembrasse de Nosso Senhor. Numa palavra: não sei explicar o que se passa em mim. São estas as consolações que o Menino Jesus me envia. Pedi-lhe para passar a Noite de Natal mal e Ele fez-me a vontade. Passei-a aflita e no meio de muitos sofrimentos. Estendia-lhe o braço e dizia-lhe: — crucificai-me à vossa santíssima vontade. Crucificai-me a mais não poder ser (sublinhamos a generosidade desta oferta), nestes últimos dias que me restam de vida e nesta noite tão santa, mas em que Vós sois tão ultrajado!

Ai, que saudade eu tinha do Céu; mas dizia assim:

Ó meu Jesus, eu queria estar no Céu a assistir à festa do vosso nascimento, mas ainda me quereis aqui: está bem. Eu não tenho outra vontade a não ser a vossa, nem outros desejos que não sejam os vossos também...

E assim fui passando a noite a fazer companhia a Nosso Senhor.

O novo ano desliza nos mesmos ou maiores abandonos e sofrimentos, mas com novas ânsias de mais sofrer pelos pecadores. Referindo-se ao muito que lhe custa falar para ditar a carta, diz a 7.1.36:

Digne-se Nosso Senhor aceitar tão grande sacrifício que estou a fazer para a conversão dos pecadores. Tanto me preocupam as almas desses pobres pecadores! Tenho tanta, tanta pena das alminhas deles! Lembrar-me que uma vez perdidas, ficam perdidas para sempre! Que tristeza! Não posso deixar de sofrer tudo e oferecer todos os sacrifícios para a salvação deles e para desagravar o meu querido Jesus.

Quando por alguns momentos eu me ponho a contemplá-lo crucificado e O vejo tão mal tratado, então redobro de pena e o meu coração enche-se de dor e tristeza, ao recordar que a cada momento Ele é horrivelmente crucificado!

Meu Padre: sofro muito. Muitas vezes o meu corpo, com tantas dores e já tão enfraquecido, parece não poder resistir mais: parece morrer. Mas o meu espírito, no meio de tudo isto, vive ainda, Deus seja louvado. Vive com grande ansiedade de sofrer cada vez mais, para assim consolar e desagravar Aquele que tanto me ama e morreu por mim. E assim, sem nem um momento de consolação, eu vou vivendo no meio de trevas e abandono, mas sempre nos braços de Jesus, a fazer-lhe sentinela aos seus Sacrários, em toda a parte onde Ele habita sacramentado. Digo-lhe assim:

Ó meu Jesus, se eu me distrair ou dormir, ou vierem sobre Vós os crimes do mundo, chamai-me com grande aflição e fortes dores, para eu ir em vossa defesa, não deixar abeirar das vossas prisões de amor os pecados do mundo. Eu quero viver e morrer nos vossos santíssimos braços, mas sempre a consolar-vos, a amar-vos, fazer-vos companhia e desagravar-vos.

Nosso Senhor satisfaz-lhe generosamente os desejos de sofrer. É ela que o lembra a 15.1.36:

O meu querido Jesus ainda se não deu por satisfeito, na minha crucifixão. Atende bem aos meus pedidos de me aumentar os meus sofrimentos.

Além das enormes dores que me torturam, sinto de novo parecer-me que estou suspensa no ar, como quem anda num bambuão abaixo e acima, para um lado e para o outro e causa-me grande aflição em todo o corpo. Também me têm aumentado muito os sofrimentos do braço esquerdo. Bendito seja Nosso Senhor; faça-se a sua santíssima vontade que também é a minha.

Mas unindo aos sofrimentos do corpo os da alma, é que são elas! Só com a força divina é que eu posso resistir.

Este abandono completo em que o meu amado Jesus se digna ter-me, custa-me, mas custa-me muito. Não ter um momento de luz nem de consolação espiritual! Mas nada de temer. Muita confiança no meu amado Jesus que me não abandonará e que hei de subir vitoriosa até ao alto do Calvário.

Transcrevamos ainda da carta de 5.3.36 algumas passagens ardentes de amor a Cristo e de zelo das almas:

Se fosse possível eu sofrer todos os sofrimentos do mundo, contanto que Nosso Senhor fosse amado por todos, eu não me recusava. Digo isto muitas vezes a Jesus:

Quem me dera poder-vos consolar, dizendo-vos: Vós não sois mais ofendido, nem vos vão mais almas para o inferno; Vós sois amado e conhecido por todos.

Oh, sim: eu quero sofrer muito, para que o vosso sangue não seja derramado inutilmente por nenhumas almas...

Na noite de 22 de Fevereiro, passei tão mal que pensava ser a última... No meio deste grande sofrimento disse a Jesus:

Ó meu Jesus, quanto mais sofrimentos, mais actos de amor para os vossos Sacrários, maior prova de amor para convosco. Sim, maior prova de amor, porque os recebo alegre e satisfeita, e maior aumento da minha confiança em Vós que me haveis de alcançar tudo quanto vos peço para as pessoas que me são tão queridas e para os pecadores...

No meio de tanto sofrer, pronunciei o Magnificat em acção de graças por tanto sofrer. Abraçava o meu Crucifixo e dizia:

Crucificai-me, meu Jesus, a valer; fazei-me semelhante a Vós, fazei-me participar da vossa santa Paixão.

E pedia a Nossa Senhora que O ajudasse a crucificar-me e dizia-lhe também: alerta, alerta: estou alerta. Eu sou a sentinela de Jesus Sacramentado. Para longe de Vós os crimes do mundo.

E agora, de novo o sentir-se carregada com os crimes do mundo. Encontramos na carta de 16.3.36:

Ontem de manhã senti uma tristeza tão profunda! Parecia-me ver-me cercada e sobrecarregada não sei de quê. Figurava-se-me que ouvi dizer:

— Que peso enorme de pecados tens sobre ti! E sobretudo a ira, a grande ira, toda a ira de Deus! O que tu tens que pagar!...

Eu ofereci-me toda a Nosso Senhor. Dizia-lhe:

Meu Jesus, dou-me toda a Vós, para vos pagar quanto me seja possível, até ao último alento, até que eu dê o meu último suspiro e entregue nas vossas divinas mãos a minha alma, para vos bendizer, louvar e amar por toda a eternidade.

Ó meu Jesus, sede comigo; não me abandoneis. Eu sou nada, nada, mas confio em Vós.

Todo este capítulo nos mostra eloquentemente que o principal na vida da Alexandrina não são consolações espirituais, êxtases contínuos de amor beatífico, visões, revelações, mas a participação cada vez mais intensa nos sofrimentos de Cristo, com o que não só atinge — e bem depressa — a total purificação do sentido e do espírito, mas ao mesmo tempo, e sobretudo, desagrava a Nosso Senhor como vítima e O ajuda a salvar almas.

Mas por muito que estas páginas nos digam dos seus grandes e variados sofrimentos, estamos por ora, apenas no vestíbulo, como iremos vendo.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Revelações - A Paixão

Meditação – Paixão de Cristo
(Revelações a Maria Valtorta)

(O abandono do Pai)

Jesus:
“O sofrimento de minha agonia espiritual tu o contemplaste na tarde de quinta-feira. Viste o teu Jesus agachar-se, como um homem ferido de morte, e que sente sua vida esvair-se através das feridas que sangram, ou como uma criatura dominada por um trauma psíquico superior às suas forças. Tu já viste as fases crescentes desse trauma, que pode terminar com a efusão de todo o sangue, provocado pelo desequilíbrio causado pelo esforço de vencer a mim mesmo e de resistir ao peso que se abateu sobre mim.
Eu era, sou o Filho do Altíssimo. Mas era também o Filho do homem. Eu quero que ressurja nítida esta dúplice natureza, igualmente total e perfeita.
De minha divindade vos dá um testemunho autêntico a minha palavra, a qual tem um timbre que somente Deus pode ter. Da minha humanidade as necessidades, as paixões, os sofrimentos, que Eu apresento, e que padeci em minha carne de verdadeiro homem, proposta como modelo à vossa humanidade, assim como Eu instruo o vosso espírito com a minha doutrina de verdadeiro Deus.
Tanto a minha santíssima Divindade, como a minha perfeitíssima humanidade, durante o curso dos séculos, e pela acção desagregadora da “vossa” humanidade imperfeita, foram se tornando desconsideradas e desfiguradas, quando se tentava explicá-las. Assim é que tornastes uma coisa irreal a minha humanidade, e a tornastes desumana, do mesmo modo que diminuístes a minha figura divina, negando-a em muitas circunstâncias em que vos era incómodo reconhecê-la ou porque não podíeis mais reconhecer, por causa de vossos espíritos dominados pelas ideias dos vícios, do ateísmo, do humanismo e do racionalismo.
Eu vou, nesta hora trágica que é o começo de universais desventuras, Eu vou refrescar vossa memória, fazendo que vos lembreis da minha dupla função de Deus e de homem, para que fiqueis sabendo como ela é, e para que a reconheçais, depois de todo o obscurantismo, com o qual a escondestes aos olhos de vossos espíritos, e para que a ameis, e vos salveis por meio dela. É a função do vosso Salvador e quem a fez conhecer e amar será salvo.
Nestes dias Eu te dei a conhecer os meus sofrimentos físicos. Eles torturaram a minha humanidade. Neles Eu te dei a conhecer os meus sofrimentos morais conexos, entretecidos, incorporados com os de minha Mãe, assim como as inextricáveis lianas das florestas equatoriais, que não se podem separar para se cortar uma só delas, mas é preciso cortá-las como um único golpe de machado, para que possa abrir uma passagem, matando-a ao mesmo tempo, do mesmo modo que se faz com as veias de um corpo que não pode ficar privado de seu sangue, pois esse é o único humor que o mantém vivo, e não se pode impedir que uma criatura, que se forma no seio de sua mãe, penetre a morte, se a mãe morrer, porque ela é a vida, o calor, o alimento e o sangue da mãe que, com um ritmo sonoro e o movimento do coração materno, penetra através das membranas internas, chegando até ao nascituro, e o completa, a fim de que possa viver.
Ela, sim! Ela, a minha pura Mãe, Ela, que me trouxe, não somente durante os nove meses, durante os quais a fêmea do homem traz em si o fruto do homem, mas por toda a sua vida. Os nossos corações estavam unidos por fibras espirituais e palpitavam sempre todos juntos, e não havia lágrima materna que caísse sem regar meu coração com o gosto salobro do seu sangue nem havia, de minha parte, nenhum lamento que despertar-se nela um sinal de dor.
Faz-vos pena ver a mães de um filho destinado à morte por alguma doença incurável, e a mãe de um condenado aos suplícios pelo rigor da justiça humana. Mas, pensai em minha Mãe que, desde o momento em que me concebeu, tremeu ao pensar que Eu era o condenado, nesta mãe que, quando me deu o primeiro beijo sobre minhas carnes macias e rosadas de um recém-nascido, pensou nas futuras chagas de seu Filho, esta Mãe, que daria dez, cem, mil vezes a sua vida para impedir que Eu me fizesse homem e chegasse ao momento da minha imolação, a esta Mãe que sabia, e que devia desejar aquela hora tremenda, aceitando a vontade do Senhor, para a glória do Senhor e por sua bondade para com a humanidade. Não. Nunca houve agonia mais longa e que terminasse numa dor ainda maior do que a minha Mãe.
E vós não tivestes uma dor maior, nem mais completa do que a minha. Eu era Um com o Pai. Ele me havia amado, desde a eternidade, como somente Deus pode amar; Ele se havia comprazia comigo, e tinha achado em Mim sua divina alegria. Os inefáveis relacionamentos que unem o Pai com o Filho desde toda a eternidade não podem ser explicados nem mesmo pela minha palavra, porque se ela é perfeita, a vossa inteligência não o é, e não podeis compreender e conhecer o que é Deus, enquanto não estiverdes com Ele no céu. Pois bem, Eu sentia como que uma água que vai subindo, e fazendo pressão sobre um dique, e vai crescendo a cada hora que passa. Assim era o rigor do Pai para comigo.
Para dar testemunho contra os homens violentos que não queriam compreender quem Eu era, o Senhor havia aberto três vezes o céu, durante o tempo da minha vida pública, no Jordão, no Tabor e em Jerusalém, na vigília da paixão. Mas Ele havia feito isso por causa dos homens, e não para me dar alívio. Eu estava sendo o expiador.
Muitas vezes, Maria, Deus faz que os homens conhecem um seu servo, a fim de que se sintam sacudidos e arrastados por esse meio, para Ele, mas isso acontece também pela dor daquele servo. É ele que paga como próprio o pão amargo do rigor de Deus, para conforto e salvação dos irmãos. Não é verdade? As vítimas de expiação conhecem o rigor de Deus. Depois virá a glória. Mas só quando a Justiça tiver sido aplacada. Não é como se fosse por meu amor que às suas vítimas Ele dá os seus beijos. Eu sou Jesus. Eu sou o Redentor, sou Aquele que sofreu e sabe, por sua experiência pessoal, o que é a dor de ser olhado com severidade por Deus e de ser abandonado por Ele. E eu não sou nunca severo, e nunca abandono. Eu me consumo igualmente, mas sim, em um incêndio de amor.
Quanto mais a hora da expiação se aproximava, mais eu sentia que o Pai se afastava. Sempre mais separado do Pai, a minha humanidade se sentia sempre menos amparada pela Divindade de Deus. E assim Eu sofria de todos os modos. A separação de Deus traz consigo o medo, traz consigo o apego à vida, traz consigo a fraqueza, o cansaço, o tédio. Quanto mais profunda ela for, mais fortes serão as suas consequências. Quando ela é total, traz o desespero. E, por um decreto de Deus, quanto mais alguém a experimenta, sem tê-la merecido, e quanto mais a sofre, porque o espírito vivo sente o afastamento de Deus, assim como uma carne viva sente o afastamento de uma articulação. Dá-se, então, um estupor doloroso, acachapante, a tal ponto, que quem não o experimentou, não sabe como ele é.
Tudo isso Eu tive que conhecer, a fim de poder interceder junto ao Pai em vosso favor. Até os vossos desesperos. Oh! Eu provei o que querem dizer estas palavras: “Eu estou sozinho”. Todos me traíram, e me abandonaram. Até o Pai? Até Deus deixou de me ajudar.” E é por isso que Eu opero misteriosos prodígios de graça para os pobres corações, que o desespero domina, e que peço aos meus predilectos que bebam do meu cálice, tão amargo para os que provam dele, afim de que eles, os que estão naufragando no mar do desespero, não recusem a cruz que Eu lhes ofereço como uma ancora de salvação, para que se agarrem nela, e Eu os possa conduzir até à margem feliz, onde só há paz.
Na tarde da Quinta-Feira só Eu é que sei se terei tido necessidade do Pai! Eu era um espírito já agonizante, pelo esforço de ter devido superar as duas maiores dores de um homem: o adeus a uma Mãe muito amada e a vizinhança do amigo traidor. Eram duas chagas que me atormentavam o coração. Uma com o seu pranto, e a outra com o seu ódio.
Eu tinha devido partir o meu pão com o meu Caim. Eu tive que falar-lhe como a um amigo, para não acusá-lo diante dos outros, de cuja violência Eu tinha a certeza, e, para impedir um delito, que afinal seria inútil, visto que tudo já estava marcado no grande livro da vida: a minha morte Santa e o suicídio de Judas. Seriam inúteis outras mortes, reprovadas por Deus. Nenhum outro sangue, que não fosse o Meu, devia ser derramada e derramado não foi. O malvado estrangulou aquela vida, fechando num saco imundo em que estava o seu corpo imundo, e também o seu sangue impuro, vendido a Satanás, sangue que não devia misturar-se, ao cair sobre a terra, com o sangue puríssimo do Inocente.
Bastariam aquelas duas feridas para fazerem de Mim um agonizante. Mas Eu era o Expiador, a Vítima, o Cordeiro. E o Cordeiro, antes de ser imolado, recebe a marca do ferro incandescente, conhece o que é o espancamento e o que é ser vendido ao açougueiro. E, em último lugar, recebe a lâmina gelada da faca, que penetra em sua garganta, faz escorrer o seu sangue, e o mata. Antes disso, ele deve deixar tudo: o pasto onde ele cresceu, a mãe em cujo peito ele se nutriu e se acalentou, os companheiros com os quais ele viveu. Tudo. Tudo isso Eu conheci: Eu o cordeiro de Deus.
Para isso é que veio o Satanás, enquanto o Pai se retirava para os Céus. Ele já havia vindo no começo da minha missão, para tentar-me e desviar-me de lá. E agora ele estava de volta. Era a hora dele. Era a hora da reunião dos demónios.
Turmas e mais turmas de demónios estavam naquela noite sobre a terra, para levarem a termo a sedução dos corações, e prepará-los para quererem a morte do Cristo no dia seguinte. Cada sinedrita tinha o seu, Herodes tinha o seu, e também Pilatos, e tinha o seu cada Judeu, que tivesse invocado sobre si o meu Sangue. Também os apóstolos tinham a seus lados os seus tentadores, que os faziam adormecer, enquanto ele ia definhando, e os preparava para cometerem um acto vil. Olha bem qual é o poder da pureza. João, o puro, livrou-se, por primeiro entre todos os outros, das garras do demónio, e voltou logo para perto do seu Jesus e o compreendeu naquele mudo desejo, e levou Maria até Mim.
Mas Judas tinha Lúcifer, e Eu tinha Lúcifer. Ele o tinha no coração, e Eu o tinha a meu lado. Éramos os dois personagens principais da tragédia. Pessoalmente, se ocupava connosco. Depois de ter levado Judas até ao ponto de onde não podia mais voltar atrás, ele virou-se para Mim.
Com a sua astúcia perfeita, ele me apresentou as torturas da carne, com uma exactidão insuperável. Também no deserto ele havia começado pela carne. E Eu o venci orando. O espírito dominou o medo da carne.
Foi, então, que ele me mostrou a inutilidade de minha morte e a utilidade de Eu viver para mim mesmo, sem preocupar-me com os homens ingratos. Viver rico, feliz, amado. Viver por causa de minha Mãe, a fim de não vê-la sofrer. Viver a fim de levar para Deus, com um longo apostolado, muitos homens, os quais uma vez que me vissem morto, logo se esqueceriam de Mim, enquanto que, se Eu tivesse sido mestre, não por três anos, mas durante lustros e mais lustros, eles teriam acabado por se compenetrarem de minha doutrina. Os seus anjos me teriam ajudado a seduzir os homens. Não estaria Eu vendo que os anjos de Deus não vinham ajudar-me? Além disso, Deus me teria perdoado, ao ver a grande quantidade de convertidos que Eu lhe teria trazido. Também lá no deserto ele me quis induzir a tentar a Deus pela imprudência. Mas Eu o venci pela oração. O espírito dominou a tentação moral.
Ele me apresentou o abandono da parte de Deus. Ele, o pai, não me amava mais. Eu estava carregado com os pecados do mundo. E lhe causava asco. Ele estava ausente e me deixou sozinho. E me abandonou ao ludíbrio de uma multidão feroz. E não concedia nem mesmo o seu divino conforto. Sozinho. Sozinho. Sozinho. Naquela hora ninguém estava perto do Cristo, a não ser Satanás. Deus e os homens não estavam lá porque não me amavam. Eles, ou me odiavam ou eram indiferentes. E eu rezava para cobrir com as minhas orações as palavras de Satanás. Mas minha oração não subia mais para Deus. Ela recaía sobre mim, como as pedras de um apedrejamento, e me esmagava sob o peso dos escombros. A oração que para Mim sempre foi uma carícia feita ao Pai, uma voz que subia a Ele, e à qual Ele respondia com carícia e uma palavra paterna, agora estava morta, era pesada, e em vão dirigida aos céus, que estavam fechados.
Foi então que Eu senti o amargor do fundo do cálice… O sabor do desespero. E era isso o que Satanás queria: levar-me ao desespero para fazer de Mim um seu escravo. Eu o venci o desespero, e o venci somente com as minhas forças, porque Eu quis vencê-lo. Somente com as minhas forças de homem. Eu não era mais do que o homem. E não era mais do que um homem não ajudado por Deus. Quando Deus ajuda é fácil suportar o mundo e tolerá-lo como um brinquedo de criança. Mas, quando Deus não ajuda mais, até o peso de uma flor causa fadiga.
Eu venci o desespero e Satanás seu criador, para servir a Deus, e dar-vos a vida. Mas tive que passar pela morte. Não a morte física de quem foi crucificado, pois isso foi menos atroz, mas a morte total, consciente, a do lutador que cai depois de triunfar, com o coração despedaçado e com o sangue que se derrama no trauma de um esforço superior às suas forças. E, então, Eu suei sangue. Suei sangue para ser fiel à vontade de Deus.
Eis porque o anjo de minha dor me fez ver a esperança de todos. O Salvador por meio do meu sacrifício, como um consolo para a minha morte.
Ele me deu os vossos nomes. E cada um deles foi para Mim uma gota de remédio derramado em minhas veias, para restituir-lhes a tensão e o funcionamento, e cada um foi para Mim uma vida que volta. No meio das desumanas torturas, para não gritar por minha dor humana, e para não perder a esperança em Deus e dizer que Ele estava sendo severo demais e injusto para com a sua Vítima, Eu repeti os vossos nomes, pois Eu vos vi. E Eu vos abençoei. E desde aquele momento Eu vos trouxe no Coração. E, quando chegou a vossa hora de estardes sobre a terra, Eu me adiantei, vindo dos Céus, para acompanhar vossa chegada, alegrando-me com o pensamento de que uma nova flor do amor havia desabrochado no mundo, e que teria vivido por Mim.
Oh! Meus benditos! Conforto do Cristo moribundo! A Mãe, o discípulo, as mulheres piedosas estavam ao redor de Mim, que estava morrendo, ainda viam junto ao rosto sofredor de minha Mãe, os vossos rostos amorosos, que se fechavam assim, felizes por se fecharem, porque vos haviam salvado, e vós, que mereceis o Sacrifício de um Deus.”

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Revelações - O pecado original

A desobediência de Eva e a obediência de Maria.
Tirado da Obra O EVANGELHO COMO ME FOI REVELADO,
Revelações de Jesus e Maria a Maria Valtorta, volume 1,
Páginas de 94 a 103.

5 de Março de 1944
Jesus diz:

Não se lê no Gênesis que Deus fez o homem para dominar tudo o que havia sobre a Terra, ou seja, tudo, com exceção de Deus e dos angélicos seus ministros? Não se lê que fez a mulher para ser companheira do homem na alegria e na dominação de todos os seres vivos? Não se lê que de tudo eles podiam comer, menos da árvore da ciência do Bem e do Mal? Por quê? O que está subentendido nas palavras “para que domines”? Que é que está subentendido na árvore da Ciência do Bem e do Mal? Nunca fizestes a vós mesmos estas perguntas, vós que viveis perguntando tantas coisas inúteis, e nunca sabeis fazer perguntas à vossa alma acerca das verdades celestes?
Vossa alma, se estivesse viva, vos responderia. Sim. A vossa alma que, quando está na graça de Deus, está bem segura, como uma flor entre as mãos do vosso anjo. Ela, a vossa alma que, quando está na graça de Deus, é como uma flor beijada pelos raios do sol e borrifada com um orvalho pelo espírito santo que aquece e ilumina, que a irriga e adorna com suas luzes celestes. Quantas verdades vos diria a vossa alma, se soubésseis conversar com ela, se a amásseis, como se deveria amar a alguém que põe em vós a semelhança com Deus, que é espírito, como também a vossa alma é espírito. Que grande amiga teríeis, se amásseis a vossa alma, em vez de odiá-la, até dar-lhe a morte? Que grande e sublime amiga com a qual poderíeis falar das coisas do céu, vós que gostais tanto de falar, e vos arruinais um ao outro com amiza­des que, se não são indignas (e algumas vezes o são), pelo menos São quase sempre inúteis, e para vós se transformam em um estrondo va­zio ou prejudicial de palavras, e de palavras completamente terrenas.

Não disse Eu: "Quem me ama guardará a minha palavra e meu Pai o amará,e viremos a ele e faremos nele morada"? A alma no esta­do de graça possui o amor e, possuindo o amor,e possui a Deus, ou se­ja, o Pai que a conserva, o Filho que a ensina, o Espírito que a ilumi­na. Ela possui, por isso, o Conhecimento, a Ciência, a Sabedoria. Ela possui a Luz. Pensai, portanto, em que conversações sublimes pode­ria entreter-se a vossa alma convosco. São essas conversações que encheram os silêncios dos calabouços, os silêncios das celas, os silên­cios dos ermos, os silêncios dos aposentos dos enfermos santos. São as que souberam confortar os que estavam encarcerados, à espera do martírio, os enclausurados por amor à busca da Verdade, os ermitãos ansiosos pelo conhecimento antecipado de Deus, os enfermos na pa­ciência, e - por que não? - no amor às suas cruzes.

Se soubésseis fazer perguntas à vossa alma, ela vos diria que o significado verdadeiro, exato, vasto como toda a criação, daquela pa­lavra "domina" é este: "Para que o homem domine tudo. Tudo em todos os seus três estados. O estado inferior, o animal. O estado do meio, o moral. E o estado superior, o espiritual. E a todos os três os ponha em ordem, para atingirem um único fim, que é possuir a Deus". Possuí-lo, tendo-o merecido por este férreo domínio, que mantém subjugadas todas as forças do eu, e faz delas escravas deste único objetivo: merecer possuir a Deus. Vossa alma vos diria que Deus tinha proibido o conhecimento do Bem e do Mal, porque o Bem tinha sido dado por Ele às suas criaturas gratuitamente, mas o Mal ele desejava que vós não o conhecêsseis, porque é um fruto doce ao paladar, mas que, descendo com o seu suco para o sangue, desperta nele uma febre que mata, e produz uma ardência tal, que quanto mais se bebe daquele suco mentiroso, mais sede se tem dele.

Vós me objetareis: "E por que foi colocado diante de nós?". E por quê? Porque o Mal é uma força que nasceu por si mesma, como nas­cem certos males monstruosos até nos corpos mais sãos.

Lúcifer era um anjo, o mais belo dos anjos.Espírito perfeito, infe­rior somente a Deus. No entanto em seu ser luminoso nasceu um va­por de soberba, que ele não tratou de dispersar, mas, ao contrário, procurou condensar, incubando-o, dessa incubação, nasceu o mal este existia, antes que o homem fosse criado, Deus havia precipitado para fora do Paraíso o maldito incubador do mal, o que sujou o para­íso. Mas este continuou sendo o eterno Incubador do Mal e, não po­dendo mais sujar o Paraíso, sujou a Terra.

Aquela planta metafórica está a demonstrar esta verdade. Deus tinha dito ao homem e à mulher: "Vós conheceis todas as leis e os mistérios da criação. Mas não queirais usurpar-me o direito de ser o Criador do homem. Para propagar a raça humana, bastará o meu amor, que circulará em vós e sem a libido de sensualidade, mas, só por um impulso de caridade, suscitará os novos Adãos da raça. Tudo eu vos dou. Só me reservo este mistério da formação do homem".

Satanás quis tirar esta virgindade intelectual do homem e, com sua língua serpentina, amoleceu e acariciou os membros e os olhos de Eva, fazendo surgir neles reflexos e sagacidades, que antes eles não tinham, porque a Malícia ainda não os tinha intoxicado.

Ela "viu". E vendo, quis experimentar. A carne foi despertada. Oh! se tivesse chama do por Deus! Se tivesse corrido para. ir dizer-lhe:
"Pai, eu estou doente. A Serpente me acariciou, e estou perturbada". O Pai a teria purificado, e curado com o seu hálito, esse hálito que, co­mo lhe havia infundido a vida, podia infundir-lhe de novo a inocência, fazendo-a esquecer-se do tóxico da Serpente, e até pondo nela a re­pugnância pela Serpente, como acontece com aqueles que foram as­saltados por algum mal, e guardam dele uma instintiva repugnância. Mas Eva não foi ao Pai. Ela voltou à Serpente. Aquela sensação foi do­ce para ela: "Vendo que o fruto da árvore era bom para se comer, e bo­nito para se ver, e agradável ao aspecto, foi apanhá-lo, e o comeu".

E "compreendeu". A malícia já tinha começado a morder-lhe as entranhas. Ela passou a ver com outros olhos, e a ouvir com outros ouvidos, os usos e as vozes dos irracionais. E passou a desejá-los com uma louca cobiça.

Ela iniciou sozinha o pecado. E o terminou com o seu companheiro. Por isso é que sobre a mulher pesa uma pena maior. Foi por meio dela que o homem se tornou rebelde a Deus e que ele conheceu a lu­xúria e a morte. Foi por ela que ele não soube mais dominar os seus três reinos: O do espírito, porque permitiu que o espírito desobede­cesse a Deus; O moral, porque permitiu que as paixões o dominassem; e da carne, porque o aviltou, submetendo-o as leis instintivas pelas quais se regem os brutos. "A Serpente me seduziu", diz Eva. "A mulher me ofereceu o fruto, e eu o comi", diz Adão. E a tríplice concupiscência rouba ao homem os seus três reinos.

Somente a Graça pode destruir as correntes com que o homem foi preso por aquele monstro desapiedado. Mas, se a Graça é viva, bem viva, mantida sempre viva pela vontade do filho fiel, ela chega a destroçar o monstro, e a não precisar temer mais nada: nem os tiranos in­ternos, isto é, a carne e as paixões; nem os tiranos externos, ou seja, o mundo e os poderosos do mundo. Nem as perseguições. Nem a morte. É, como diz o Apóstolo Paulo: "Nenhuma destas coisas eu temo, nem amo a minha vida mais do que a mim mesmo, contanto que eu leve a bom termo a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus, que é o de dar testemunho do Evangelho da Graça de Deus".
[ ... ]" . [8 de março de 1944.]

Maria, Nossa Senhora, diz:

"Na alegria, pois, quando compreendi a missão a que Deus me destinava, fiquei repleta de alegria, o meu coração se abriu como um lírio que desabrocha, e dele se derramou o sangue, que foi como o terreno para o embrião do Senhor.
Alegria de ser mãe.

Eu me tinha consagrado a Deus desde minha tenra idade, porque a luz do Altíssimo me havia feito conhecer a causa do mal no mundo e eu quis, por quanto estava em meu poder, anular por mim mesma o plano de Satanás.

Eu ainda não sabia que eu era sem a mancha do pecado. Nem eu podia pensar que o era. Só pensar nisso, teria sido presunção e sober­ba, porque, nascida de pais humanos, não me era lícito nem pensar que logo eu é que ia ser a Escolhida para ser a Sem Mácula.

O Espírito de Deus me tinha instruído sobre a dor do Pai, diante a corrupção de Eva, que tinha querido aviltar-se, ela que era uma criatura por graça, descendo ao nível de uma criatura inferior. Havia em mim a intenção de amenizar aquela dor, reconduzindo a minha carne à pureza angélica, ao conservar-me inviolada por pensamentos, desejos e contactos humanos. Só por ele o meu coração palpitava de amor, só a ele eu consagrava o meu ser. Mas, se não havia em mim o ardor da carne, contudo ainda havia o sacrifício de não ser mãe.

A maternidade, livre de tudo o que agora a avilta, tinha sido con­cedida assim pelo Pai Criador também a Eva. Uma doce e pura mat­ernidade, sem o peso da sensualidade! Eu a experimentei! De quantas vantagens Eva se despojou, quando renunciou a uma riqueza de tal porte! Essa riqueza era muito mais do que a imortalidade. E que não vos pareça um exagero dizer isso. De fato, o meu Jesus, e com Ele eu, sua Mãe, tivemos de passar pelos langores da morte. Eu passei por ela, como alguém que, cansado, adormece docemente, e Ele, por meio do atroz sofrimento de quem está morrendo porque a isso foi conde­nado. Portanto, também para nós houve morte. Mas a maternidade sem aqueles pesos e sem aquelas violações, só aconteceu comigo, que sou a nova Eva, a fim de que eu pudesse dizer ao mundo que doçura teria sido para a mulher chamada a ser mãe, se não sentisse a dor em sua carne. Ora, o desejo dessa maternidade pura podia estar, e esta­va, também na virgem toda de Deus, pois a maternidade é a glória da mulher. Se pensardes, então, em qual honra era tida a mulher mãe entre os israelitas, mais ainda podereis pensar no sacrifício que eu fiz, ao consagrar-me a Deus com a privação da maternidade.

Mas o Eterno Bem quis dar à sua serva este dom, sem precisar ela perder O candor de que estava revestida para ser uma flor sobre o seu trono. E eu me sentia jubilosa com a dupla alegria de poder ser a mãe de um homem e, ao mesmo tempo, ser Mãe de Deus.
Alegria de ser Aquela pela qual a paz se estabelecia entre O Céu e a Terra.
Oh! Ter desejado tanto essa paz, por amor de Deus e do próximo, e saber que através de mim, uma pobre serva do Todo-Poderoso, é que tal paz estaria vindo ao mundo! E poder dizer: "O' homens, não choreis mais, pois eu trago em mim o segredo que vos tornará felizes. Eu não vo-lo posso dizer, porque está selado em mim, no meu co­ração, assim como está fechado o filho em meu ventre inviolado. Mas eu já o estou trazendo no meio de vós, mas cada hora que passa, vai ficando mais perto o momento em que o vereis, e conhecereis seu No­me Santo".

Alegria de ter feito feliz a Deus: alegria de quem crê ter feito feliz ao seu Deus.

Oh! Sim. Ter tirado do coração de Deus a amargura da desobe­diência de Eva! Da soberba de Eva! Da sua incredulidade!
Meu Jesus me explicou qual foi a culpa com que se manchou o Primeiro Casal. Eu anulei aquela culpa, refazendo, de um modo re­troativo para subir depois, as etapas da sua descida.

O principio da culpa estava na desobediência: "Não comais da­quela arvore, e não toqueis nela", tinha dito Deus. Mas o homem e a mulher, os reis da criação, que podiam tocar em tudo e comer de tudo, menos daquela árvore, porque Deus queria torná-los só inferiores aos anjos, não levaram em conta aquela proibição.

A árvore: o meio para provar a obediência dos filhos.

Que é a obediência ao mandamento de Deus?É um bem, porque Deus só manda o bem. E que é a desobediência?É um mal, porque põe a alma naquelas disposições de rebelião, oferecendo a satanás um campo propicio para as suas operações.

Eva vai até à árvore,da qual teria vindo o seu bem,se fugisse dela,ou o seu mal,aproximando-se dela.Ela vai à árvore,arrastada por uma curiosidade infantil,querendo ver o que é que a árvore tinha em si de especial,e,levada pela imprudência,que lhe faz parecer inútil o mandamento de Deus, pois ela, Eva, se sente forte e pura,é a rainha do Éden,no qual tudo lhe obedece,e onde nada lhe poderá fazer mal.É assim que sua presunção causa sua ruína.A presunção é um fermento da soberba.

Junto à árvore, ela encontra o sedutor, que se aproveita da sua inexperiência virgem e tão bela. E tão mal protegida por ela, para cantar-lhe a canção da mentira ( Agora, Arnaldo, você vai ler como Lúcifer tentou Eva ): “Crês tu que isso, seja um mal ? Não!!! Deus te disse isso, porque vos quer conservar escravos do se poder! Pensais que sois reis ? Nem liberdade tendes, como a têm os animais. Pois aos animais foi concedido que se amem com verdadeiro amor.Mas a vós,não.Ao animal foi concedido ser criador como Deus.Ele gerará filhos e verá crescer a vontade sua família.Mas vós,não.é A vós e negada essa alegria. Para que, então, fazer-vos homem e mulher, se entendes que viver desse modo ? Sede deuses! Não sabeis que alegria é estarem dois numa só carne, para que dessa união se crie uma terceira pessoa, e até muitas outras ?Não acrediteis nas promessas de Deus de que tereis alegria em vossos descendentes, vendo os vossos filhos criarem novas famílias, deixando por causa delas seu pai e sua mãe.Deus vos deu apenas uma sombra de vida.A verdadeira vida é conhecer as leis da vida.Então,sim,sereis semelhantes a deuses e podereis dizer a Deus:”Somos iguais a ti”.

E a sedução continuou,porque não houve vontade de acabar com o que não era licito ao homem conhecer.É ai que a árvore proibida se torna realmente mortífera para a raça humana,pois dos seus ramos está pendurado o fruto da amarga sabedoria,que vem de satanás.A mulher ai se torna uma fêmea e,com o fermento do conhecimento satânico no coração,vai corromper a seu companheiro,Adão.Aviltada,pois,a carne,corrompido o moral,degradado o espírito,o que eles passaram a conhecer foi a dor e a morte do espírito,que ficou privado da graça,e da carne,que ficou privada da imortalidade.A ferida de Eva gerou o sofrimento,que não se aplacará,enquanto não se extinguir a vida do último casal sobre a terra.

Eu percorri, de modo regressivo, os caminhos daqueles dois pecadores. Eu obedeci. Obedeci de todos os modos. Deus me pediu que eu permanecesse virgem.Eu obedeci.Tendo amado a virgindade,que me tornava pura como a primeira das mulheres,antes de conhecer a satanás,Deus me pediu que fosse esposa.Eu obedeci,colocando o matrimônio naquele primeiro grau de pureza que estava no pensamento de Deus,quando criou os dois primeiros.Convicta de que estava destinada à solidão no matrimônio,e a ser desprezada pelos outros, por causa da minha esterilidade voluntária,agora Deus me pedia que eu me tornasse mãe.Eu obedeci.Eu cri que isso fosse possível e que aquela palavra veio de Deus,porque,ao ouvi-la,difundiu-se em mim uma grande paz.Não fiquei pensando assim:”Eu mereci isto”.Não fiquei dizendo a mim mesma: “ Agora, o mundo vai me admirar, pois eu já sou semelhante a Deus, criando a carne de Deus”. Não. Eu me aniquilei na humildade.

A alegria brotou-me do coração, como um pedúnculo de roseira florida. Mas esta viu-se bem depressa ornada com agudos espinhos e apertada no emaranhado da dor, como aqueles ramos que ficam enrolados por algumas trepadeiras. A dor, pela dor do esposo: eis a angústia em minha alegria. A dor pela do meu filho: eis o espinho em minha alegria.

Eva quis o gozo, o triunfo, a liberdade. Eu aceitei a dor, o aniquilamento, a escravidão. Renunciei à minha vida tranqüila, à estimada do meu esposo, à minha própria liberdade. Não conservei nada para mim. Fiz-me a criada de Deus na carne, no moral, no espírito, confiando-me a Ele, não só para a concepção virginal, mas para a defesa de minha honra, para a consolação do esposo, para o meio com o qual ele pudesse entender a purificação do matrimônio, de tal modo a fazer de nós dois os que haveriam de restituir ao homem e à mulher a dignidade perdida.
Abracei a vontade do Senhor, por mim mesmo, pelo esposo e por meu filho. Eu disse: “Sim” para todos os três, certa de que Deus não teria faltado com a sua palavra, quando prometeu me socorrer em minha dor de esposa que teria julgada culpada, de mãe que se vê gerando, para entregar o filho à dor.

“Sim”, eu disse. Sim. E basta. Aquele “sim” anulou o “não” de Eva ao mandamento de Deus. "Sim, Senhor, como quiseres. Conhece­rei o que é que Tu queres. Viverei como Tu queres. Alegrar-me-ei, se Tu quiseres. Sofrerei pelo que Tu quiseres. Sim, sempre sim, meu Senhor, desde o momento em que o raio, que partiu de Ti, me fez Mãe, até o momento em que me chamaste a Ti. Sim, sempre sim. Todas as vozes da carne, todas as paixões do moral, sob o peso deste meu per­pétuo sim. E acima, como sobre um pedestal de diamante, o meu espírito, ao qual faltam asas para voar a Ti, mas que é senhor de todo o eu domado, é feito servo teu. Servo na alegria, servo na dor. Mas, sorri, o meu Deus! E sê feliz! A culpa foi vencida. Foi tirada, foi destruída. Ela agora esta sob a meu calcanhar, foi lavada em meu pranto, des­truída pela minha obediência. De meu ventre nascera a Árvore nova, que ha de ter em si o Fruto, que conhecerá todo a Mal por tê-lo pade­cido em Si, e que dará todo a Bem. A ele poderão ir as homens, e eu me darei por feliz, se eles colherem desse fruto, ainda que eles não pensem que este fruto nasce de mim. Contanto que a homem se salve, e que Deus seja amado, que se faça desta tua serva o que se faz do so­lo sobre a qual surge uma árvore: um degrau para subir".

Maria(Nossa Senhora se dirige a Maria Valtorta), é preciso saber sempre ser degrau, para que as outros subam para Deus. Se nos pisam, não faz mal. Contanto que consigam andar até a Cruz. É a nova árvore que tem o fruto do conhecimento do Bem e do Mal, porque diz ao homem o que é mal e o que é bem, a Fim de que ele saiba escolher e viver, e sabe, ao mesmo tempo, fazer de si um licor para curar as intoxicados pelo mal que eles quiseram saborear. O nosso coração esteia sob os pés dos homens, contanto que o número dos redimidos cresça, e que o Sangue do meu Jesus não seja derramado sem fruto. Eis a sorte das servas do Senhor. Mas depois merecemos receber no ventre a Hóstia santa e, aos pés da Cruz, im­pregnada pelo Seu Sangue e pelo nosso pranto, dizer: "Eis aqui, ó Pai, a Hóstia imaculada, que te oferecemos pela salvação do mundo. Olha para nós, o Pai, unidas com e la e pelos seus merecimentos infi­nitos, dá-nos a tua bênção".

Eu te dou minhas caricias. Repousa, minha filha. O Senhor está contigo".

Jesus diz:

"A palavra de minha Mãe deveria dissipar toda e qualquer titubeação de pensamento, até mesmo nos mais bloqueados com relação as fórmulas.

Eu disse “árvore metafórica”. Agora vou dizer :”árvore simbólica”.Talvez assim compreendais melhor.O símbolo dela é claro: do modo como os dois filhos de Deus teria procedido a respeito dela,se teria podido compreender como era neles a tendência para o bem ou para o mal.Como a água régia prova o ouro e a balança do ourives pesa os quilates do ouro,aquela árvore tinha-se tornado uma “missão”por causa da ordem de Deus a respeito dela e deu a medida da pureza do metal de Adão e Eva.

Estou já ouvindo a vossa objeção: ’’Não foi rigorosa demais a condenação, e pueril o meio usado para condená-los? ”.

Não foi.Uma desobediência hoje em vós,que sois os herdeiros deles,é menos grave do que a que foi neles.Vós sois redimidos por mim.Más o veneno de Satanás continua sempre pronto a se levantar de novo,como certas doenças que nunca saem totalmente do sangue.Eles,os dois progenitores,eram possuidores da Graça,sem nunca terem sido nem de leve tocados pela desgraça.Por isso eram mais fortes,mais amparados pela Graça,que gerava neles inocência e amor.Infinito era o dom que Deus lhes havia dado.Bem mais grave, por isso,foi a queda deles,não obstantes aquele dom.

Simbólico também é o fruto oferecido e comido. Era o fruto de uma experiência que se quis fazer, por instigação satânica, contra a ordem de Deus. (agora, Jesus Fala enquanto Deus, enquanto verbo de Deus) Eu não havia interdito aos homens o amor. Queria unicamente que se amassem sem malicia; como eu os amava com a minha santidade, eles deviam amar-se na santidade, eles deviam amar-se na santidade de afetos que nenhum libido emporcalha.
Não se há de esquecer que a graça é luz e quem a possui e conhece o que é útil e bom conhecer. A cheia de graça conheceu tudo, porque a sabedoria a instruía, a sabedoria que é graça, e ela soube guiar-se santamente. Eva, pois, conhecia o que lhe era bom conhecer. E não mais do que isso, porque é inútiu conhecer o que não e bom. Não teve fé nas palavras de Deus e não foi fiel à sua promessa de obediência. Acreditou em Satánas, infringiu a promessa,quis saber o que não é bom e o amou sem remorso, e fez que o amor, que eu tinha dado como uma coisa santa, se tornasse uma coisa corrompida,uma coisa aviltada. Anjo decaído, rolou na lama e nas palhas, quando podia correr feliz por entre as flores do paraíso terrestre e ver florescer ao redor de si a prole,assim como uma árvore que se cobre de flores, sem precisar curvar sua copa para o brejo.

Não fiqueis como os meninos tolos de que eu falo no evangelho os quais ouviram cantar,e taparam os ouvidos,ouviram tocar e não dançaram,ouviram chorar, e quiseram rir.Não sejais mesquinhos, e não sejas negadores.Aceitai,aceitai a luz sem malicia e teimosia,sem ironia e incredulidade.E sobre isto, basta.

Para fazer-vos compreender o quanto deveis ser gratos para com “Aquele que morreu para elevar-vos ao céu e para vencer a concupiscência de Satanás,eu vos quis falar neste tempo de preparação para a Páscoa, desde que foi o primeiro elo da corrente com que o verbo do pai foi arrastado à morte, o Cordeiro divino ao matadouro.Disse “ eu vos quis falar” , porque agora noventa por cento entre vós é semelhante à Eva intoxicada pelo hálito e pela palavra de Lúcifer, e não viveis para amar-vos, mas para saciar-vos de sensualidade, não viveis para o céu, mas para a lama, não sois mais criaturas dotadas de alma e de razão, mas uns cães sem alma e sem razão. A alma, vós já a mataste; e a razão, já a depravastes. Em verdade, eu vos digo que os animais irracionais estão acima de vós na honestidade dos seus amores”. (Como dói ouvir isso, mas Jesus tem sim razão)

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Capítulo 7 - As Lições

1934-1935

Conhecido o Mestre e indicada a Escola, venham as lições.

Uma das mais insistentes que o Mestre lhe dá refere-se às disposições da Discípula, para bem O ouvir e aprender: o desprendimento do mundo, o silêncio. É essencial na pedagogia divina este silêncio; já o lembra o Espírito Santo, quando diz que leva a alma à solidão, para aí lhe falar ao coração.

Mas oiçamos a Alexandrina:

Tenho momentos que me sinto tão abatida e sem nenhum fervor! E, pensando eu na minha indignidade, diz-me Nosso Senhor que escolhe os fracos, para os tornar fortes e que é debaixo das minhas faltas que Ele esconde o seu poder, o seu amor e a sua glória. Pede-me para eu esquecer o mundo e me entregar toda a Ele:

— Abandona-te nos meus braços que Eu te escolherei os caminhos. (27.9.34)

Nosso Senhor diz-me que quer que eu morra para o mundo e o mundo morra para mim. Ele é que é o mundo para quem eu hei de viver, e em quem hei de pensar, amar e imitar; que nele encontro todos os tesoiros. (4.10. 4)

Eu às vezes digo assim: ó meu Jesus, eu quero ser toda vossa e só para Vós quero viver. E o meu Jesus diz-me assim:

— O minha querida filha, Eu quero que sejas toda, toda minha e que só para mim vivas e que só a mim ames e só a mim procures. (26.10.34)

Quantas vezes Jesus lhe manda aprender esse silêncio e desprendimento no Sacrário!

Mas o que o Senhor mais lhe inculca, para que ela o compreenda, viva plenamente, é a missão a que a destinou desde toda a eternidade: a missão de vítima pelos pecadores. Longe iríamos se transcrevêssemos de suas cartas tudo o que a este ponto se refere. Algumas passagens ao menos. Já acima vimos como ela, sem saber como, se ofereceu a Nosso Senhor como vítima. De longe começara o Espírito Santo a despertá-la e a orientá-la para esta missão. Até que a 6.9.34, lhe dirige pela primeira vez o célebre convite a que ela se refere, em carta ao director espiritual, nos termos seguintes:

Vou fazer também um grande sacrifício, Nosso Senhor bem o sabe e V. Rev.cia também faz uma ideia do quanto me custa; mas antes de o fazer, ofereci-o ao meu bom Jesus.

Quinta-feira, dia 6, o Sr. Abade veio trazer Nosso Senhor a uma doente, minha vizinha e ao mesmo tempo trouxe também para mim. Depois de comungar, não sei como fiquei: estava fria, parecia que não sabia dar graças. Mas louvado seja o meu bom Jesus: não olhou para a minha indignidade nem para a minha frieza. Parecia-me ouvir dizer:

— Dá-me as tuas mãos que as quero cravar comigo,

dá-me os teus pés que os quero cravar comigo,

dá-me a tua cabeça que a quero coroar de espinhos, como me fizeram a mim;

dá-me o teu coração que o quero trespassar com a lança, como me trespassaram a mim.

Consagra-me todo o teu corpo, oferece-te toda a Mim, que te quero possuir por completo e fazer o que me aprouver.

Foi isto bastante — continua ela — para me ter tido muito preocupada. Não sabia o que havia de fazer. Calar-me e não dizer nada? Parece-me que o meu Jesus não queria que eu ocultasse isto. Isto repetiu-se na sexta-feira e hoje dia de Nossa Senhora (dia 8 de Setembro), assim como a (recomendação da) obediência em tudo, como já expliquei a V. Rev.cia.

Este convite do Mestre vai repetir-se amiudadas vezes, por exemplo, em Outubro (carta de 11.10.34):

Quando Nosso Senhor me pede o meu corpo, quando chega à coroação de espinhos, diz-me:

— Que dores horríveis Eu senti quando me coroavam de espinhos! Perdi tanto sangue, tanto inútil! Fiquei exausto de forças. As minhas carnes despedaçadas; até a minha beleza desapareceu. E no meio de tantos algozes, queres, minha querida filha, participar comigo de toda a minha Paixão? Oh, não me dês uma negativa: ajuda-me na redenção do género humano!

Este convite, tão vibrante e tão claro foi aceite generosamente, mas essa crucifixão irá, nas suas realizações, até grandes extremos, como veremos, sobretudo daí a quatro anos. Por isso, o trabalho de Jesus agora é confirmá-la, adestrá-la para o perfeito cumprimento dos seus divinos desígnios.

Minha filha, minha filhinha, se soubesses o bem que te quer a Providência; se soubesses como és amada no Céu pela Santíssima Trindade!

Corresponde a este amor. Anda para os meus Sacrários. Vive lá. É de lá que vem a força para tudo. Ama-me muito; pensa só em mim. Deixa o mundo e tudo o que nele existe que é nada.

A missão que te confiei são os meus Sacrários e os pecadores; elevei-te a tão alto grau. É o meu amor. Por ti serão salvos muitos, muitos, muitos pecadores; não pelos teus merecimentos, mas por mim que procuro todos os meios para os salvar. (20.12.34)

Já a 15.12.34, ouvia ela:

Sê a minha vítima de reparação pelos pecados do mundo e assim me consolarás muito. Peço-te o sacrifício de vires passar parte desta noite comigo, nos meus Sacrários. Tem pena de mim; tem pena do Prisioneiro do Amor, nesta quadra em que sou tão ofendido! Anda formar com as tuas dores um abrigo sobre os meus Sacrários, para que não venham sobre Mim os crimes. Eu te prometo grande recompensa. Nossa Senhora e a Santíssima Trindade ficam-te muito agradecidos.

E pediu-me — continua ela — que guardasse silêncio o mais que pudesse. Eu atendi ao pedido de Nosso Senhor e que bela noite eu passei! Até depois da meia-noite estive alerta: cantava, rezava, pedia ao meu Jesus que me desse a bênção de todos os Sacrários do mundo.

E estamos no ano de 1935.

No dia 4.1 — escreve ela ao director — pouco depois da sagrada Comunhão, falava-me Nosso Senhor e dizia-me:

— Queres encontrar-Me, minha filha? Procura-me no teu coração e na tua alma. Habito lá a penetrar em ti mais e mais o meu amor e a santificar-te mais. O teu coração é o meu sacrário e a ti é sempre nos meus Sacrários que Eu te quero encontrar a pedir-me pelos pecadores, e quero que me digas muitas vezes que és toda minha.

Se soubesses como Me consolas! E como acodes aos pecadores só em Me dizeres que és minha vítima!

A minha paga é o meu amor e um lugar no Céu tão lindo, tão lindo, muito perto de Mim, muito unidinha a Mim. Se tu pudesses vê-lo, seria o bastante para a tua morte: morrerias de alegria. Não penses em nada deste mundo que não és dele. Ama-Me muito. Olha que te confio os meus Sacrários e os pecadores.

Para mais despertar a sua generosidade, Jesus repetidíssimas vezes lhe mostra o estado do mundo: pecado, pecado e mais pecado!

Minha filha — diz Jesus a 3.1.35 — o sofrimento e a Cruz é a chave do Céu. Sofri tanto para abrir o Céu à Humanidade, e para tantos é inútil!

Dizem: quero gozar, não vim ao mundo para mais nada. Quero satisfazer as minhas paixões.

Dizem: não há inferno! Eu morri por eles e dizem que não Me mandaram; e contra Mim dizem heresias e proferem blasfémias.

Eu para os salvar escolho as almas: ponho-lhes sobre os ombros a cruz e sujeito-me a auxiliá-las. E feliz da alma que compreende o valor do sofrimento! A minha Cruz é suave sendo levada por meu amor.

E disse-me Nosso Senhor — prossegue ela — que se eu sofresse alegre e resignada por seu amor todos os sofrimentos que Ele me enviasse, que abriria o céu a milhares e milhares de pecadores.

Disse-me também que mandasse dizer a V. Rev.cia, que nesta quadra eram mais as almas que se perdiam do que as que se salvavam. Que queria guerra aberta contra o pecado da impureza, que era com que o inferno estava mais povoado.

Em carta de 27.1.35:

No dia 13, das 8 às 9 da noite, estava a rezar a estação ao Santíssimo Sacramento e já me parecia que Nosso Senhor me falava. No fim fiz a comunhão espiritual e então dizia-me Nosso Senhor:

— Ouve, minha filha, e atende ao pedido do teu Jesus: anda fazer-me companhia nos meus Sacrários, nesta noite, nestas horas em que Eu sou mais ofendido.

Não me deixes sozinho, tem pena de Mim! Anda com essas tuas dores e com as tuas orações sustentar o braço da minha justiça, prestes a cair sobre os pecadores, que ainda para alguns o baixarei sem castigar; mas para muitos não! Muitos no pecado e daí a poucos momentos no inferno!

Eu morri por eles e por eles dei o meu sangue e por eles fiquei nos Sacrários há tantos séculos; e lá estarei até ao fim. Mas eles desprezam as minhas graças: triste verdade!

Lições como estas repete-as o Mestre divino constantemente. Em resumo: Deus ininterrupta e horrorosamente ofendido; a Paixão de Cristo misticamente renovada a cada instante; os pecadores a caírem sem cessar no inferno, aos montes , como nuvens de mosquitos . Remédio para desagravar a Deus, consolar a Cristo e salvar ainda muitos milhares de pecadores? — As almas-vítimas a orar incessantemente e a sofrer generosamente, em união com o único Redentor, com Cristo Crucificado e imolado no Altar.

Mais que nunca, preciso de vítimas do meu amor, para sustentar o braço da minha justiça, e tenho tão poucas!... Ainda que tivesse muitos milhares de vítimas, ainda era pouco para tantos pecados e crimes. (1.11.34)

Mas o Mestre não ensina só quando lhe fala e a consola, mas também com os silêncios que se vão tornando cada vez mais prolongados.

A 21.2.35, assim escreve ela:

Desde o dia 14 ainda Nosso Senhor me não tornou a falar. Mas eu estou conforme com tudo o que for da sua santíssima vontade. Bendito Ele seja. Ao menos não me faltam os desejos de O amar cada vez mais e de O fazer amado e conhecido de todos os corações.

Oh, que desejos eu tenho que Nosso Senhor seja amado por todos, como eu própria O queria amar! E como me sinto bem, quando digo a Nosso Senhor: não me poupeis a mim os sofrimentos e sacrifícios e poupai aos pecadores as penas do inferno.

Bom proveito este tirado das lições recebidas.

A 2 de Maio encontramos um silêncio mais longo:

Passaram-se 14 dias sem que Nosso Senhor me falasse; procurei fazer em tudo a sua santíssima vontade e proceder sempre como se ouvisse a sua divina voz, passando os dias unida o mais que me é possível ao meu querido Jesus Sacramentado. E que consolação para a minha alma quando chega a noite e vejo que não tenho tido grandes distracções. Toda e tudo o que se passar em mim ofereço a Nosso Senhor, tanto de noite como de dia; e muitas vezes digo a Nosso Senhor: ó meu Jesus, eu não vos quero sozinho nem um momento nem de dia nem de noite, em todos os lugares onde habitais sacramentado. Quero viver sempre unidinha a Vós.

Jesus interrompe nesse 2 de Maio o silêncio. Quando a Alexandrina lhe dizia:

Ó meu bom Jesus, vinde à minha alma. Não desprezeis a minha indignidade; vivei em mim!

Nosso Senhor assim lhe respondia:

Ó minha filha, sempre em ti vivo. Escuta o teu Jesus: anda passar parte da noite nos meus Sacrários.

Contempla-os; pede-me pelos pecadores, nas horas em que tantos dormem e tantos me ofendem. Sê a minha vítima. Vela comigo.

Assim pedi aos meus discípulos. Não durmas tu: sê-me fiel no que te peço. Vou enriquecer-te dos meus tesoiros, dos meus frutos. Vou encher-te dos meus dons. Vela comigo. Faz-me companhia com os Anjos, nos meus Sacrários. Oferece-te-Me como vítima.

Oh, como Me consolas! Eu habito em ti. Finjo abandonar-te, mas nunca te abandono.

Mas daí a pouco voltava o silêncio.

Parece que Nosso Senhor se escondeu de mim por completo — escreve a 23.5.35.

— Faz amanhã quinze dias que Nosso Senhor me não tornou a falar; e não me tenho confessado nem comungado. Tenho grandes desejos de receber o meu querido Jesus e muito O queria receber sequer mais uma vez, neste bendito mês de Nossa Senhora. Mas o que hei de eu fazer? Seja feita em tudo a vontade do meu bom Jesus.

Estes silêncios eram uma nota do bom aproveitamento da discípula.

É chegado o tempo que deposites em mim toda a tua confiança — dizia-lhe o Mestre a 30.5.35.

E mais adiante, a 25.8.35:

É porque te apanhei firme no meu amor.

E a cerração vai sendo cada vez mais densa:

O meu amado Jesus, agora, esconde-se muito — desabafa ela a 25.7.35 — deixa-me lutar com os meus sofrimentos que, sem cessar um momento, me vão consumindo o meu pobre corpo. Que consolação para mim é sofrer!

Ainda a 3.10.35:

Nosso Senhor escondeu-se de mim, mas escondeu-se a valer. Bendito Ele seja e faça-se a sua santíssima vontade. Eu não aspiro a outra coisa senão a que seja feita em tudo e sempre. Eu só queria morrer de amor. Queria ser a vítima da Eucaristia. Assim o digo ao meu querido Jesus, que quero ser vítima por Ele em todos lugares onde Ele habita sacramentado. E que consolação ser vítima do amor de Jesus, para lhe acudir aos pecadores! E como é consolador dizer a Jesus:

— Eu sou a sentinela dos vossos Sacrários, assim como o soldado é a sentinela do seu quartel; só com a diferença que o soldado muitas vezes cumpre obrigado e com medo ao castigo; mas eu quero cumprir e ser fiel por amor doido a Jesus Sacramentado.

domingo, 10 de agosto de 2008

Capítulo 6 - Na Escola da Eucaristia

1934-1935

Quem lê a correspondência — melhor diríamos o diário espiritual — da Alexandrina de fins de 1933 a fins de 1935, descobrirá que ela vive aí um período de intensa iniciação sobre a vocação que Deus lhe destina na Terra. É o próprio Jesus Cristo que vem ao seu encontro, como Director e Mestre e lhe pede toda a atenção às lições que na Escola da Eucaristia lhe vai dar, para que não só ela as aprenda e pratique, mas as comunique depois a muitas almas que lhe hão de seguir o exemplo.

Dos escritos desses dois anos excertámos alguma coisa, para vermos quem é o Mestre, qual a Escola, quais as lições e qual a discípula.

E primeiramente o Mestre.

Em carta de 27.9.1934, lemos:

Disse-me o meu amado Jesus que será Ele o meu Director e o meu Mestre contínuo, frequente, habitual e V. Rev.cia lá de longe; mas que tenho que lhe obedecer primeiro em tudo do que a Ele. Disse-me também para dizer a V. Rev.cia que a minha peregrinação na Terra não será longa, mas que grandes coisas me esperam.

A 1.11.34:

Minha filha, não estou só contigo quando me pedes para te consolar. Sou teu mestre. Feliz de ti, se bem aprenderes as minhas lições e as praticares.

O que temes tu? — pergunta-lhe a 9.12.34 — se Eu sou o Mestre dos mestres, o director dos directores?

Referindo-se a esta época, escreve nas notas autobiográficas:

Desde então tinha Jesus à minha ordem, falando-me de dia e de noite. Sentia grande consolação espiritual; não me custavam os meus sofrimentos. Em tudo sentia amor ao meu Jesus e sentia que Ele me amava, pois dele recebia carícias sem conta. Só me desejava sozinha. O como me sentia bem no silêncio unidinha a Ele!... Jesus desabafava muito comigo.

Como não havia a Alexandrina de experimentar que Jesus a amava, se eram tão extremas as delicadezas deste divino Mestre para com a sua discípula?

Pouco antes de mandar escrever esta carta — diz ela a 4.10.34 — Nosso Senhor pediu-me o meu coração para o colocar dentro do dele, para que não tivesse outro amor a não ser a Ele e às suas obras. Disse-me que cabiam lá todos, mas que o meu tinha um lugar reservado... escolhi-te para mim, corresponde ao meu amor. Quero ser o teu esposo, o teu amado, o teu tudo; escolhi-te também para a felicidade de muitas almas.

E acrescenta ela:

Diz-me que sou um canal por onde hão de passar as graças que eu hei de distribuir às almas e pelo qual hão de vir as almas a Ele. Diz-me mais o meu Jesus, que se serve de mim, para que por mim vão a Ele muitas almas e por mim sejam excitadas a amá-lo na santíssima Eucaristia.

No primeiro sábado de Outubro desse mesmo ano (6.10.1934, ver carta de 11.10.1934), afirmava Nosso Senhor:

Já que tão generosamente te ofereces como vítima pelos pecados do mundo, Eu colocarei em ti como que um canal para passarem as graças às almas.

O Mestre, artista infinito, pretende realizar nela uma obra-prima:

Manda dizer ao teu Pai Espiritual que te vou modelando e preparando para coisas mais sublimes (11.10.34)

Hei de fazer em ti grandes coisas. (1º sábado de Dezembro de 1934)

Eu ainda não estou satisfeito: ainda te quero mais crucificada. (11.12.34)

E por isso em breve a veremos mergulhada na noite passiva do sentido e sobretudo na mais terrível do espírito.

A empresa é árdua, mas para lhe incutir coragem e confiança, Jesus multiplica as suas carícias: quantas vezes a estreita e a abrasa intensamente em seu amor!

Minha filha, ó minha amada, Eu estou contigo! Oh, como Eu te amo! São tão fortes as cadeias de amor que me prendem a ti que as não posso quebrar, não te posso abandonar. (1.11.34, carta, pág. 42)

Já antes lhe tinha prometido que sempre estaria com ela e que nunca mais a abandonaria. (26.10.34)

Com tal Mestre, as lições, apesar de sublimes e difíceis de praticar, vão ser aprendidas e executadas com toda a pontualidade e amor.

De mais a mais é à luz da Eucaristia, na Escola do Sacrário que o Mestre a ensina.

Desde menina que a Alexandrina teve pela Eucaristia devoção notável. Já o vimos ao falar da sua primeira Comunhão e da sua oração nos primeiros anos e das deliciosas preces que com Maria Santíssima dirigia a Jesus Sacramentado.

Aos dezanove anos acamou para não mais se levantar. Referem-se a essa época estas palavras:

Tinha muitas saudades do Jesus da nossa Igreja; e quando havia festas do Sagrado Coração de Jesus e missas cantadas, eu chorava amargamente.

Lá mesmo da cama, "cantava o Tantum ergo, como se estivesse na Igreja e fosse receber a bênção de Nosso Senhor. Como não tinha Santíssimo Sacramento em casa..., pedia a Nosso Senhor que me desse a bênção do Céu e de todos os Sacrários".

Pertencia à pia Obra das Marias dos Sacrários-Calvários, por isso gozava do indulto de Missa em casa, quando impedida por doença de ir à Igreja. Grande foi o seu júbilo, quando dada a aquiescência do Prelado arquidiocesano, pôde, a 20 de Novembro de 1933, assistir à santa Missa a que já há tantos anos não assistia. Daí por diante tinha mensalmente essa consolação.

Amaríssima se tornou para ela a época em que, mudado o Pároco, deixou de comungar todos os dias. Declara a propósito, a 27.9.34:

Com grande mágoa e saudade lhe digo que ainda não tornei a receber a Nosso Senhor. Se eu pudesse pagar e me trouxessem Nosso Senhor por dinheiro, quanto não daria eu! Mas paciência. Tenho feito muitas comunhões espirituais com o maior fervor que tenho podido e Nosso Senhor vai-me dando a recompensa.

A 26.10.34, expressa de novo a mesma pena:

Ainda não tornei a receber o meu querido Jesus desde o dia 13; ai, meu Deus, que pena eu tenho! Peça muito a Nosso Senhor que, por sua infinita misericórdia, se digne dar algum meio a isto.

Só passado talvez mais de um ano é que as coisas mudaram. Por isso a 6.6.35, exclama:

Eu continuo muito doentinha; mas tenho tido a consolação de receber Nosso Senhor todos os dias. Isto só por um milagre do Céu, pois o Sr. Abade nunca me fez tal....

A 4 do mês seguinte repete:

Tenho recebido todos os dias o meu amado Jesus; apesar de não ouvir sempre a sua divina voz, ó como eu me sinto bem com a divina presença sacramental em mim! Que paz eu sinto na minha pobre alma! Como sinto desejos de O amar sempre e cada vez mais!

A confirmar e intensificar este amor à Eucaristia que o divino Espírito Santo nela despertou desde menina, vem agora o Mestre divino, vezes inúmeras, a repetir que a Escola onde a quer ininterruptamente é nos Sacrários. Já a 27.9.34, escreve ela ao director espiritual:

Nosso Senhor não cessa de me pedir as coisas que lhe tenho dito. Convida-me muito para os Sacrários:

— Anda minha filha, entristecer-te comigo, participar da minha prisão de amor e reparar tanto abandono e esquecimento. Manda dizer ao teu Pai Espiritual que quero que seja pregada a devoção aos Sacrários, muito, mas muito.

A 15.10.34, de novo:

Anda para a minha escola, aprende com o teu Jesus o amor ao silêncio, a humildade, a obediência e o abandono. Anda para os meus Sacrários: estou sozinho, tão ofendido, tão desprezado, e tão pouco visitado! Anda, prostrar-te diante de mim, pede-me perdão pelo teu desânimo e pela tua desconfiança.

Alerta nos meus Sacrários! Estou sozinho em tantos, tantos! Passam-se dias e dias que me não visitam e não me amam e não me desagravam! (28.10.34)

No dia 1.11.34, escreve:

Outra ocasião disse-me o meu Jesus:

— Minha filha, minha querida, ó minha amada: estou contigo; amo-te tanto!

E pediu-me que O amasse também muito; mas que não queria só o meu amor: que fizesse com que outros O amassem também. Pediu-me que fixasse a minha morada nos seus Sacrários. Que queria muitas guardas fiéis prostradas diante dos Sacrários, para que não deixassem lá cair tantos e tantos crimes. Que ao menos eu O amasse e reparasse.

Nosso Senhor disse-me para eu fazer um contrato com Ele: eu ir consolá-Lo e amá-Lo em todos os Sacrários e Ele me consolaria a mim em todas as minhas aflições e necessidades.

Eu disse a Nosso Senhor: a quem vou eu consolar? Ao meu Criador, ao meu Amor, ao Rei do Céu e da Terra?!...

E Nosso Senhor disse-me:

Que tens tu com isso? Escolhi-te assim. É debaixo da tua grande miséria e de teus crimes que Eu escondo a minha grandeza, a minha omnipotência e os raios da minha glória. Anda para os meus Sacrários, repara no meu silêncio, na minha humildade, no meu abatimento. Faz que Eu seja amado por todos, no meu Sacramento de amor, o maior dos meus Sacramentos, o maior milagre da minha sabedoria.

Disse-me também — prossegue a Alexandrina a 8.11.34 — que me dizia como à Madalena: que eu escolhi a melhor parte. Amar o meu Coração, amar-me Crucificado é bom; mas amar--me nos meus Sacrários, onde me podes contemplar, não com os olhos do corpo, mas com os olhos da alma e do espírito, onde estou em corpo e alma e divindade, como no Céu... Escolheste o que há de mais sublime. O tempo passa, o tempo é breve e Eu te escolho um lugar no Céu muito pertinho de mim, assim como na Terra escolheste estar junto de mim, nos meus Sacrários.

Alexandrina de Balasar

Alexandrina Maria da Costa, mais conhecida como Alexandrina de Balasar ou Santinha de Balasar, declarada beata pela Igreja Católica em 25 de Abril de 2004, nasceu no lugar de Gresufes, freguesia de Balasar (Póvoa de Varzim), em Portugal, no dia 30 de Março de 1904, e faleceu no lugar do Calvário, da mesma freguesia, em 13 de Outubro de 1955.



Nascida no meio católico e rural de Balasar, para frequentar a escola primária, Alexandrina mudou-se em 1911 para Póvoa de Varzim, onde viveu na pensão de um marceneiro, na Rua da Junqueira. Ao fim de dezoito meses, regressou à aldeia natal, para o lugar do Calvário.

Começou a trabalhar na lavoura, como era usual na altura. Era uma menina vigorosa, a ponto de afirmar na Autobiografia que a equiparavam aos homens no que diz respeito ao rendimento do trabalho. Aos 12 anos adoeceu, ficando a sua saúde, a partir desse momento, comprometida.

Com 14 anos, no dia de Sábado Santo (antes da Páscoa) de 1918, estando a trabalhar em costura com a sua irmã Deolinda e outra menina, deu um salto do quarto onde estava para se defender de agressores que invadiram a casa, numa atitude semelhante à de Santa Maria Goretti.

Até aos seus 19 anos ainda se conseguia movimentar sofrivelmente, tendo gosto em ir à igreja. Contudo, a paralisia foi-se agravando até 14 de Abril de 1925, data em que ficou, definitivamente, de cama, durante trinta anos.

A sua intenção inicial era tornar-se missionária e, por isso, orava à virgem Maria para que ficasse curada. Em 1928, chegou à conclusão de que a sua vocação era compartilhar misticamente o sofrimento de Cristo, oferecendo-se como vítima pelos pecadores.

De 3 de Outubro de 1938 a 24 de Março de 1942, todas as sextas-feiras, vivia os sofrimentos da Paixão de Cristo: superando a paralisia, descia da cama e, dando mostras de sofrimento físico, repetia, por três horas e meia, as etapas da Via Sacra. Existe um registo filmado de um destes êxtases e um circunstanciado relato de um outro, publicado pelo Pe. José Alves Terças nas páginas de "A Paixão Dolorosa" (este escrito, ilustrado com alguns desenhos, pôs pela primeira vez a Alexandrina nas bocas do mundo).

O padre jesuíta Mariano Pinho, seu director de 1933 a 1942, exortou-a a ditar as suas vivências místicas. A sua obra escrita (autobiografia, cartas, diário) enche cerca de 5 000 páginas.

Em 1936, por intermédio do mesmo director, fez vários pedidos à Santa Sé no sentido de que o mundo fosse consagrado ao Imaculado Coração de Maria, o que fez despertar o interesse do Vaticano pelo seu caso. A 31 de Outubro de 1942, o Papa Pio XII satisfez esse desejo, numa mensagem transmitida a partir de Fátima (celebravam-se os 25 anos das Aparições), repetindo-se este acto na Basílica de São Pedro no dia 8 de Dezembro do mesmo ano.

A partir 27 de Março de 1942 é alegado que deixou de se alimentar nos seguintes 13 anos de vida, vivendo exclusivamente da comunhão diária.

Para verificar a inédia, em 1943, foi internada no Refúgio de Paralisia Infantil, na Foz do Douro. Foi aí submetida à vigilância de um grupo de médicos, dirigidos pelo Dr. Henrique Gomes de Araújo, membro da Sociedade Portuguesa de Química e da Real Academia de Medicina de Madrid, por um período de 40 dias. No final, asseguraram que era "absolutamente certo" que durante aquele tempo não tinha comido, bebido, defecado ou urinado.

O mesmo Dr. Henrique Gomes de Araújo, a quem o Dr. Azevedo pedira "o estudo das faculdades mentais da doente", descreveu-a nestes termos:

«A expressão de Alexandrina é viva, perfeita, afectuosa, boa e acariciadora; atitude sincera, sem pretensões, natural.

Não há nela ascetismo, nada untuoso, nem voz tímida, melíflua, rítmica; não é exaltada nem fácil a dar conselhos.

Fala de modo natural, inteligente, mesmo subtil; responde sem hesitações, até com convicção, sempre em harmonia com a sua estrutura psíquica e a construção sólida de juízos bem delineados em si e pelo ambiente, mas sempre, repetimo-lo, com ar de espontânea bondade que o clima místico que desde há tempos a circunda e que, parece, não foi por ela provocado, não modificaram.»

Sobretudo nos anos finais da sua vida, começou a desenvolver-se em torno da Alexandrina um fenómeno de popularidade, que levou muita gente em peregrinação até ao seu leito em busca de aconselhamento espiritual.


Entre os estudiosos da sua vida e escritos, que tornaram viável a abertura, desenvolvimento e conclusão do Processo Diocesano para a beatificação e canonização, destacam-se, além do já citado Pe. Mariano Pinho, o italiano Pe. Humberto Pasquale e o Casal Signorile. Os livros escritos por este Casal (os professores Chiaffredo e Eugénia) são referência importante para o conhecimento da obra de Alexandrina (alguns deles, como a recorrentemente citada «Figlia del Dolore Madre di Amore» estão disponíveis on-line).

Os seus devotos consideram-na uma das maiores figuras de toda a história da Igreja, equiparando-a a Santa Teresa de Ávila, Santa Catarina de Siena, etc.

A divulgação da sua vida iniciou-se em Balasar, mas atingiu larga escala a partir do Norte de Itália, onde trabalhou o Padre Humberto Pasquale, e da organização irlandesa «Alexandrina Society», cujo boletim é, ainda hoje, publicado para vários países de todos os continentes. Em Balasar publicou-se um boletim durante duas décadas e meia. Hoje, a divulgação faz-se em larga medida pela Internet.

A beatificação de Alexandrina Maria da Costa assentou numa cura ocorrida em Estrasburgo com uma emigrante oriunda da freguesia de Esmeriz, Vila Nova de Famalicão; esta cura foi declarada inexplicável à luz dos actuais conhecimentos da medicina.

O Dr. Manuel Augusto Dias de Azevedo, seu médico assistente desde janeiro de 1941, até à morte de Alexandrina, foi também um dos seus mais activos defensores e o criador e redactor do boletim que se publicou em Balasar.

Revelações - A Agonia

MEDITAÇÕES
(Maria Valtorta)

Diz Jesus:
“Tu viste quanto custa ser salvadores. Viste em mim e em Maria. As nossas torturas conheceste, e viste com que generosidade, com que heroísmo, com que paciência, com que humildade, com que constância, com que fortaleza as suportamos pela caridade de salvar-vos.
Todos aqueles que pedem ao senhor Deus para fazer deles “Salvadores”, devem pensar bem que Eu e Maria somos os modelos e que aquelas são as torturas que devem compartilhar para salvar. Não serão a cruz, os espinhos, os pregos, os flagelos materiais. Serão outras, de outra forma e natureza. Mas igualmente dolorosos e igualmente consumantes. E é somente consumando o sacrifício entre aquelas dores que se pode tornar-se salvadores.
É uma missão austera. A mais austera de todas. Aquela a respeito da qual a vida do monge e da monja da regra mais severa é uma flor, comparada a um monte de espinhos. Porque esta não é uma regra de Ordem humana. Mas regra de sacerdócio, de uma consagração divina, cujo fundador sou Eu, eu que consagro e acolho em minha Regra, em minha Ordem, os eleitos dela, e imponho a eles o Meu hábito, a dor total, até o sacrifício.
Tu viste os meus sofrimentos. Eles foram para reparar as vossas culpas. Nada em meu corpo foi excluído deles, porque nada no homem é ausente de culpa e todas as partes do vosso físico e moral, aquele eu que Deus vos deu com uma perfeição de ordem divina e que vós aviltastes com a culpa do progenitor e com as vossas tendências ao mal, com a vossa vontade escrava, são instrumentos de que vos servis para realizar o pecado.
Mas Eu vim para anular os efeitos do pecado com o Meu Sangue e a minha dor, lavando as vossas partes físicas e morais neles, para limpá-las e para torná-las fortes contra as tendências culpáveis.
As minhas mãos foram feridas e aprisionadas, depois de serem forçadas a levar a Cruz, para reparar todos os delitos pela mão do homem. Daqueles verdadeiros e próprios para reger e manobrar uma arma contra o irmão, fazendo de vós Cains, aqueles membros capazes de roubar, de escrever falsas acusações, de fazer actos contra o respeito do vosso e dos outros corpos, e de ficar no ócio, que é terreno propicio aos vícios. Pela vossa ilícita liberdade das mãos fiz crucificar as minhas, pregadas no lenho, privando-as de todo o modo mais que lícito e necessário.
Os pés de vosso Salvador, depois de terem sido afadigados e contundidos sobre as pedras de meu caminho de Paixão, foram transpassados, imobilizados para reparar todo o mal que vós fazeis com os pés, fazendo deles o meio para ir aos vossos delitos, furtos, fornicações. Assinalei as vias, as praças, escadas, as casas de terra, de todo o mal que havia nascido dentro e sobre elas, semeando nos séculos passados e nos séculos futuros pelo vosso mal querer, obediente às instigações de Satanás.
As minhas Carnes foram maculadas, contundidas, laceradas, para punir em Mim todo o culto exagerado, a idolatria que vós dais á vossa carne, e que amais por capricho de sentido e também por afecto que em si não é reprovável, mas que tornais tal, amando um progenitor, um cônjuge, um filho, um irmão mais do que amais a Deus.
Não. Sobre todo o amor e todo o vínculo na terra há, deve haver o amor pelo Senhor vosso Deus. Nenhum, nenhum outro afecto deve ser superior a este. Amai os vossos em Deus. Amai com tudo de vós mesmos a Deus. Isso não impedirá o vosso amor, aponto de vos tornardes indiferentes aos que estão próximos, mas antes alimentará o vosso amor por eles com a perfeição desejada por Deus, porque quem ama deus, tem Deus em si, e tendo Deus tem a perfeição.
Eu fiz de minhas Carnes uma chaga para lavar as vossas do veneno dos sentidos, do não pudor, do não respeito, da ambição e admiração pela carne destinada a tornar-se pó. Não é com o culto à carne que se leva a carne à beleza. É com a separação dessa que se dá a ela a beleza eterna no Céu de Deus.
A minha Cabeça foi torturada por mil torturas: as batidas, o sol, os gritos, os espinhos, para reparar as culpas de vossa mente. Soberba, impaciência, falta de suportação do sofrimento pululam como cogumelos em vossa cabeça. Eu fiz da Cabeça um órgão torturado, fechado em escrínio decorado de sangue, para reparar tudo o que brota de vosso pensamento.
A única coroa que Eu quis, tu viste. A coroa que só um louco ou um supliciado pode levar. Ninguém que seja são de mente (humanamente falando) e livre de si, se impõe tal coroa. Mas Eu era julgado um louco, e louco, sobrenaturalmente, divinamente louco era, querendo morrer para vencer o mal em vós, sabendo que o amais mais que a Deus, e estava à mercê do homem, seu prisioneiro, seu condenado. Eu, Deus, condenado pelo homem.
Quantas impaciências vós tendes por quase nada, quantas incompatibilidades por coisas vãs, quantas dificuldades para aceitar o mal estar! Mas olhai o vosso Salvador. Meditai o que deveria haver de excitante naquele mudar contínuo de lugar, naquele arrancar os cabelos, naquele agarrar continuo de lugar, naquele agarrar contínuo, movendo a cabeça, apoiando-a sem modos como um tormento! Mas pensai o que eram para a minha Cabeça torturada, dolorosa, febril, os gritos da multidão, as batidas, o sol quente! Mas reflecti que dor deveria ter em minha Cabeça, durante a agonia da Sexta-feira, já transformada em dor pelo esforço da noite de Quinta-feira, em minha pobre Cabeça, na qual a saliva da febre de todo o Corpo dilacerado e das intoxicações provocadas pelas torturas!
E na Cabeça os olhos tiveram a sua dor, e a tiveram a boca, o nariz e a língua. Para reparar os vossos olhares amantes de ver aquilo que é mal e tão esquecido de procurar Deus, para reparar as muitas rudes e luxuriosas palavras que dizeis, em vez de usar os lábios para pregar, para ensinar, para confortar; tiveram a sua tortura o nariz e a língua para reparar os vossos ciúmes e a vossa sensualidade do olfacto, pelos quais também cometeis imperfeições que são terreno para mais graves culpas, e culpas com avidez de alimentos supérfluos, sem piedade de quem tem fome, de alimentos que vos podeis permitir muitas vezes recorrendo a meios ilícitos de conseguir.
Os meus órgãos não estiveram livres de sofrer. Nenhum deles. Sufocações e tosse para os pulmões contundidos pela bárbara flagelação e tornados edemáticos pela posição na cruz. Afã e dor ao coração destroçado e tornado enfermo pela cruel flagelação, pela dor moral que a havia precedido, pela fadiga da subida sob o grave peso do lenho, pela anemia consecitiva a todo o sangue perdido. Fígado congestionado, baço, rins contundidos e congestionados.
Tu viste a coroa arroxeada que estava em torno dos meus rins. Os vossos estudiosos, para dar uma prova à vossa incredibilidade com respeito àquele provo do meu sofrimento, que é a síndrome, explicam como o sangue, o suor cadavérico e a ureia de um corpo super fatigado puderam, misturando-se aos aromas, produzir aquela natural pintura do meu Corpo extinto e torturado.
Melhor seria crer sem ter necessidade de tantas provas para crer. Melhor seria dizer: “Isto é obra de Deus!” e bendizer a Deus que vos concedeu ter a prova indubitável de minha crucificação e das precedentes torturas!
Mas porque, agora, não sabeis mais crer com a simplicidade das crianças, mas tendes necessidade de provas científicas – pobre fé a vossa, que sem o apoio e o aguilhão da ciência não sabe estar firme e caminhar – sabei que as contusões ferozes dos meus rins foram os agentes químicos mais potentes do milagre da Síndrome. Os meus rins, quase exauridos pelos flagelos, não puderam mais trabalhar. Como aquelas queimadas pelas chamas, foram incapazes de filtrar, e a ureia acumulou-se e se espalhou em meu sangue, em meu corpo, dando os sofrimentos da intoxicação urêmica, e o reagente que transpirando do meu cadáver fixou a imagem sobre a tela. Mas quem é o médico entre vós, ou quem entre vós está doente de uremia, pode compreender quais sofrimentos deveriam dar-me as toxinas urêmicas, tão abundantes a ponto de ser capazes de produzir a imagem indelével.
A sede. Que tortura a sede! Porém tu viste. Não houve alguém, entre tantos, que naquelas horas soube dar-me uma gota de água. Desde a cheia, Eu não tive nenhum conforto. E febre, sol, calor, poeira, sangramentos, davam tanta sede ao vosso Salvador.
Tu viste que rejeitei o vinho com mirra. Não queria adoçar meus sofrimentos. Quando alguém se oferta como vítima, é necessário ser vítima sem transacções piedosas, sem comprometimentos, sem adoçamentos. É necessário beber o cálice assim como nos é dado. Experimentar o azedo e o fel até ao fim. Não o vinho drogado que produz um alívio da dor.
Oh! A sorte de vítima é bem severa! Mas, bem-aventurado quem a elege por sua sorte.
Este é o sofrer de teu Jesus em seu Corpo inocente. E não te falo das torturas do afecto por minha Mãe e pela sua dor. Era necessária aquela dor. Mas par Mim foi uma espada cruel. Só o Pai sabe o que sofreu o seu Verbo no espírito, na moral, no físico! Também a presença da Mãe, se foi a coisa mais desejada de meu Coração, que tinha necessidade de ter aquele conforto na solidão infinita que o circundava, infinita, solidão provinda de Deus e dos homens, foi uma tortura.
Ela devia estar lá anjo de carne para impedir a desesperação de assaltar-me como o anjo espiritual a havia impedido no Getsêmani; devia estar lá para unir a minha dor à sua dor pela vossa redenção; devia estar lá para receber a investidura de Mãe do género humano. Nem mesmo a traição, nem o conhecimento que o meu sacrifício seria inútil para tantos, estas duas dores que poucas horas antes me pareceram tão grandes até ao ponto de fazer-me suar sangue, eram incomparáveis com esta.
Mas tu viste como foi grande Maria naquela hora. A separação não a impediu de ser mais forte que Judite. Esta matou. Aquela se fez matar através de sua criatura. E não imprecou, e não odiou. Rezou, amou, obedeceu. Mãe sempre, até em pensar, no meio daquelas torturas, que o seu Jesus tinha necessidade de seu véu virginal sobre suas carnes inocentes para defesa de seu pudor (quando retiraram as vestes a Jesus par ser crucificado, Maria entregou a um soldado o se véu com o qual Jesus cobriu as suas partes). Ela soube ser ao mesmo tempo Filha do Pai dos Céus e obedecer à sua tremenda vontade naquela hora. Não imprecou, não se rebelou. Nem a deus, nem aos homens. Perdoou a estes, disse “Fiat” Àquele.
Também depois tu a ouviste: “Pai, Eu te amo e Tu nos amaste!” Recorda e proclama que Deus a amou e lhe renova o seu acto de amor. Naquela hora! Depois que o Pai a transpassou e tirou a razão de ser. Ama-o. Não diz: “Não te amo, porque Tu me golpeaste!” Ama-o e não se aflige por sua dor, mas por aquela sofrida pelo seu Filho. Não grita pelo seu Coração despedaçado, mas pelo Meu trespassado. Disto pede razão ao Pai, não de sua dor. Pede razão ao pai em nome de seu Filho.
Ela é bem a Esposa de Deus. Ela é bem aquela que concebeu pela união com deus. Ela sabe que contacto humano não gerou a sua Criatura, mas somente o Fogo aceso pelo Céu, que penetrou em seu Seio Imaculado e depôs o Germe divino, a Carne do Homem-Deus, do Deus-Homem, do Redentor do mundo. Ela sabe, e como esposa e mãe, pede razão daquela ferida. As outras deveriam ser dadas. Mas esta, quando tudo foi realizado, por quê?
Pobre Mãe! Houve um porquê, que a Tua dor não te permitiu ler sobre a minha ferida. E foi para que os homens vissem o Coração de Deus. Tu o viste Maria. E não o esqueceras jamais.
Mas, o vês? Maria, não obstante não veja naquele momento as razões sobrenaturais daquela ferida, pensa logo que essa me fez mal e bendisse a Deus. Que aquela ferida faça tanto mal a Ela, pobre Mãe, Ela não percebe. Não me fez mal a Mim, e isto basta e serve para bendizer a Deus que a imola.
Pede unicamente um pouco de conforto para não morrer. É necessária à Igreja nascente, da qual foi criada Mãe, poucas horas antes. A Igreja, como um recém-nascido, tem necessidade de cuidados e de leite materno. Maria o dará à Igreja, sustentando os apóstolos, falando a estes do Salvador, rezando pela Igreja. Mas como o poderia fazer, se morresse naquela tarde? A Igreja, que tinha pousos dias por permanecer sem seu Chefe, permaneceria órfã totalmente, se também a Mãe partisse. E a sorte dos recém-nascidos órfãos é sempre precária.
Deus não desilude jamais uma justa oração e conforta os seus filhos que esperam nele. Maria prova-o no conforto de Verónica. Ela, a pobre Mãe, estampou nos olhos a efígie do Meu rosto morto. Mas não pode resistir a esse olhar. Não é mais o seu Jesus, aquele envelhecido, sofrido, com os olhos fechados que não a observam, com a boca contorcida que não lhe fala e sorri. Mas eis um Rosto que é de Jesus vivo, doloroso, ferido, mas vivo ainda. Eis o seu olhar que a olha, a sua boca que parece dizer: “Mamãe!” Eis o seu sorriso que a saúda ainda.
Oh!, Maria! Procura o teu Jesus em tua dor. Ele virá sempre e te olhará, e te chamará, te sorrira. Partilharemos a dor, e estaremos unidos!
João, o pequeno João, partilhou com Maria e com Jesus a dor. Sê como João sempre. Também nisto já te disse: “Não serás grande pela contemplação e pelos ditados. Estes são Meus. Mas pelo teu amor”.
Olha com que viva e delicada sensibilidade João conduz na noite de Quinta-Feira até à noite de Sexta-Feira. E além disso observemo-lo naquelas horas.
Um momento de desânimo. Uma hora de peso. Mas, superado o sono com o acontecimento da captura e do amor, ele vem, saindo atrás de Pedro, par que o Mestre tenha um conforto vendo o Chefe dos apóstolos e o Predilecto entre os apóstolos.
E depois, pensa na Mãe, à qual qualquer cruel poderia capturar. E vai até Ela. Ele não sabe que Maria já vive a separação do Filho e que, enquanto os apóstolos dormiam, Ela velava e orava, agonizando com o Filho. Ele não sabia. E vai a Ela e a prepara para a notícia.
E depois faz o caminho entre a casa de Caifás e o Pretório, a casa de Caifás e a casa real de Herodes. E faz isso naquela manhã, atravessando a multidão embriagada de ódio, com as vestes que o acusam como galileu; isso não é fácil. Mas o amor o sustém e ele não pensa em si, mas nas dores de Jesus e de sua Mãe. Poderia ser lapidado, porque é seguidor do Nazareno. Não importa. Ele desafia tudo. Os outros fugiram, estão escondidos, a prudência e o medo os conduzem. A ele é o amor que conduz, e permanece e se mostra. É um puro. O amor prospera na pureza.
E sua piedade e o seu bom senso o induzem a manter Maria longe da multidão e do pretório – ele não sabe que Maria compartilha todas as torturas do Filho, sofrendo espiritualmente – quando julga ser a hora que Jesus tem necessidade da Mãe e que não é licito manter ainda a Mãe separada do Filho, ele a Conduz a Ele, a sustenta, a defende.
O que é aquele punhado de pessoas fiéis: um homem só, inerme, jovem, sem autoridade, como chefe de poucas mulheres, contra toda uma multidão bestealizada. Nada. Um monte de folhas que o vente pode dispersar. Uma pequena barca sobre um oceano em tempestade que a pode fazer submergir. Não importa. O amor é a sua força e a sua vela. Ele vai armado pelo amor, e com este protege a Mulher e as mulheres até ao fim.
João possuiu o amor de compaixão como nenhum outro no mundo, exceptuando minha Mãe. Ele é o modelo dos amorosos deste amor. É o teu mestre nisto. Segue-o no exemplo que te dá de pureza e de caridade, e serás grande.
Vai em paz, agora. Te abençoo. "

Retirado de: Recados de Aarão